terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

HISTÓRIAS E ESTÓRIAS IV

NA TERRA DO JÁ ERA

Em torno dos anos oitenta, no final da década, não consigo precisar a data, recebi em minha residência a visita de Icléa Passos Rodrigues, Diretora da Faculdade de Educação Musical do Paraná, na companhia da arte-educadora Ana Mae Barbosa, Diretora do Museu de Arte da USP, a qual tive a honra de conhece-la. Queriam degustar nosso prato típico, o barreado e as levei até o Restaurante da Ieda. Na época era o mais representativo e freqüentado estabelecimento da nossa tradicional gastronomia.
Antes de chegar ao restaurante, demos uma volta pela cidade e como bom anfitrião fui mostrando e relatando nossos pontos e monumentos importantes. Mostrei o abandonado Cine Ópera, a Estação Ferroviária desativada e em péssimas condições.
No almoço degustamos um saboroso barreado, em uma mesa localizada de frente para a baía, onde pudemos apreciar a nossa bela paisagem. De lá seguimos até a Ponta da Pita, passando pelo Matarazzo, onde também fui questionado sobre o que era aquilo. - “Bem, aqui é o complexo Matarazzo, moinho e porto, mas não mais funciona, aliás, era o Matarazzo”, me reportei. E segui apresentando: “ali era o Porto de Antonina...” “Aqui era o estádio de futebol da Associação Atlética Matarazzo...” E assim por diante.
No final do passeio as visitas agradeceram a hospitalidade e uma delas me falou: “não sei se você percebeu, mas você mora na terra do já era”. A colocação foi contundente, mas levamos em tom de brincadeira.
Dias depois, comecei a questionar o roteiro que me induziu para tais afirmações: “aqui era o... Ali era a...”.
O abandono e a decadência econômica da cidade, que perdurou por mais de trinta anos, nos tornou simples locutores do passado. Deixamos de viver o presente e desacreditamos no futuro.

No ano de 1990, conversando com Wilson Paulista, fundador e compositor da escola de samba Grêmio Recreativo Amigos da Pita, a mais nova agremiação da cidade, tive oportunidade de narrar tal fato, o da “terra do já era”.
Um mês depois, Paulista me apresentou o samba enredo da escola, cujo tema escolhido foi: “ A terra do já era”.
O prefeito da época, Leopoldino de Abreu, desprovido de qualquer compromisso democrático e de posições autoritárias, não permitiu que a escola de samba da Pita desenvolvesse tal enredo. Atitude totalmente prejudicial àquele carnaval, pois a Pita não conseguiu desfilar e outras duas escolas, Capela e Batel em solidariedade também não saíram. A administração municipal conseguiu “transformar o nosso carnaval em cinzas” era a frase que estampava centenas de camisetas na avenida.
No carnaval seguinte, os ânimos foram contornados e finalmente a Pita fez sua estréia na avenida do samba, com o enredo “ A terra do já era”. Este foi o refrão mais cantado pelos integrantes da jovem escola da Pita:  “Olhe a Pita aí minha gente” Paulista toava no ritmo do samba da “ A terra do já era”

E na terra do já era,
Era uma vez,
O Cine Teatro,
As Indústrias Matarazzo,
E a Estação que vinha o trem.
Hoje tudo é passado,
Já era o porto também,
E você pergunta pra esse povo,
Naturalmente ele diz ta tudo bem.

2 comentários:

  1. Esta é a Terra do já era...
    Que um dia já foi...
    E que o povo espera que ela volte a ser...

    ResponderExcluir
  2. ... Velho Teatro foi embora... com o Mercado Municipal...
    Então se liga minha gente, se não vai acabar o carnaval!...

    Bó, sempre canto este samba enrredo com a minha mãe quando estamos tomando uma 'benge' na casa dela, imaginando que estamos na terrinha.

    Engraçado, como é que eles sabiam que ia acontecer tudo que esta música diz? Se não estou enganada, eu tinha uns 8 anos quando fizeram este samba enrredo, tema da Ponta da Pita, certo?

    Abraços!

    ... Vamos lutar até o fim!

    ResponderExcluir

Comente com responsabilidade e se identifique.